segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

O "poderia ter sido"


A cada ida, arranca-me algo a mais
No escuro, nada se vê ou se percebe
No horizonte de meu mais profundo sonho,
Guardo desenhos do que poderia ter sido.
A cada lágrima que se vai, somos iguais.

No repertório no qual se baseia uma vida vazia,
No ritmo de sua irrevogável esperança,
Dançam nossos futuros, que não mais o são.
Saudosas imagens emprestadas aos romances
Que vemos nos livros e na televisão.

A cada fim se imortaliza uma união
Permito-me uma cumplicidade silenciosa
Que também ameaça se eternizar.
Que nos enterre, então,
Nossas doces memórias de ninar.

Yáskara Fabíola
Poetisa

Racismo


o filme era de Orson Welles
e Almir o único negro naquela sala de cinema
de  Ipanema
no ar desconforto silencioso
pelo fato de haver um invasor
quase  alienígena

 cena mais forte
do que as verdades e mentiras da tela
acontecia no palco escuro

não disfarçava – se olhares e resmungos
explicito ataque
ao abusado transgressor

éramos dois intrusos naquele lugar
porque dessa maneira tratavam
negros e brancos pobres.

Flávio Machado
Poeta

Negro da escravidão


Cor da diferença
Cor do desprezo
Cor da inocência
Cor do preconceito.
Cor da obediência
Cor do trabalho forçado
Cor da carência
Cor dos maus tratos.
Cor sem alma
Cor sem recusa
Cor que só ouve, não fala
Cor de uma época injusta.

Na sombra da pobreza
Escondidos nas senzalas do senhores,
Algemados nos pés da fraqueza
Roendo ossos dos precursores.

Ouvindo e calando a voz da tristeza,
Silenciados pela obsessão
Cortados como carnes por sobre a mesa
Comercializados para a escravidão.

Jéssica Lima
Poetisa

Dom


Queria ter o dom
De acha pérolas.
Palavras,
Secretas.

As procuro
Sempre...
Sem vacilar.

Mas elas fogem,
Escapam pelas arestas.
Frustro-me
Rendo-me

O que me resta?
Contemplar as pérolas,
Deixadas...
Usadas...
Pelos verdadeiros poetas.

Macely Souza
Poetisa

Relicário


Estamos guardados
No embalo de outro tempo
No embalo da emoção
Que nos tem tão facilmente.
Não somos solitários
Tampouco estamos juntos
Somos uma luz que fraqueja
Porém, nunca se apaga.
Não me peça explicação
Ou palavras forçadas
No meu silêncio se esconde
Tudo o que precisa ouvir.

Somos a oscilação
Da intensa sensação
Que nunca nos deixou.
Somos água e pedra
Você me esbarra, me quebra
Na insistência de nos unir.
Somos a mistura perfeita
De essências que nos envolvem
Nos enchem, nos inebriam.
E inebriada, me deixou
Quando, por fim, se tornou
Nosso pecado, apenas passado...

Yáskara Fabíola
Poetisa