segunda-feira, 29 de abril de 2013

Decreto

Decreto o final da poesia saudosista,
Da poesia doente,
E que seus poetas morram!

Decreto o fim da bestialidade humana
Mas que todo ser humano besta
Sobreviva.

Decreto que o próximo seja amado
Mas não mais que amado
Que o umbigo.

Mas que todo umbigo
Continue sendo menor
Do tamanho que já é.

Decreto que as meninas
Cubram suas bocas
Com balas de café

E que os meninos
Aceitem balas de café
Chupadas

E que palavras nossas
Sejam palavras nossas.

Decreto que ninguém deve sentir
Como se não pudesse sentir

E que sinta como achar
Que o sentir lhe faz sentido,
Sem que seu sentido seja marcha de palhaço.

Decreto o fim das linhas
Que se entortam e
Morrem.

Decreto, aliás,
Minha imortalidade.

Quem nasceu para escrever
Não morre.

Decreto que o teto
De todos os quartos
De todas as crianças,

Seja azul.

Seja azul para que
Todas as crianças de
Todos os quartos

Possam, ainda, acreditar
Que existe azul no Céu
Embora uma escala cinza lhe seja erguida
Em olhos.

Decreto o fim - para sempre -
Daquelas palavras
Que não foram ouvidas.

Decreto que não haja
Uma forma sequer de sussurro.

Palavras foram feitas
Para que alguém
As grite!

Decreto o fim
Dos dilemas caóticos
Do povo sem coração.

Decreto morte
Aos sentimentos maus.

E vida, decreto vida,
Àqueles que nos fazem
Sonhar à noite.

E, no mais,
Decreto que meus decretos
Não sejam leis - estas não servem,
Estas são feias.

E se meu decreto for lido
Em alta voz,
Que seja lido
Por uma criança
Que acredita em fadas.

Decreto final:
Nenhuma palavra deve machucar.



Clarissa Damasceno Melo
Poetisa

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Inferno Atlântico



Eu tenho em mim essa enjoação de nascença, sinto que é incurável
Culpo a infância,
Deveria ser árvore ao invés de terra;
Deveria ter sido criada a árvores e não a paredes
Eu me ampliei pra menos e não acredito em minha salvação
Meu status é o de ser sozinha, minhas certezas estão jogadas a trapos
Minha bio não consta no reino animal,
Gosto do cheiro fresco da titica de galinha, do reflexo do sol nos meus cílios e da sua boca.
As vezes penso que só quero algo liquido, substancial
Já tomei vários barris de vinho e ainda não resolvi nenhum dos problemas
Penso que viver, no meu caso não seja questão de prefixo e sim de sufixo,um sufixo nervoso
Nunca bebi nada sagrado, mas já te degustei com os olhos, com o nariz e com o toque suave de minhas mãos ásperas.
No amor encontrei a faca e o queijo postos em minhas mãos, mas eu queria a fome
Minha estupidez não tem data de vencimento, tem data de estouramento
Explodir sempre e retrair jamais,
Sou uma mulher vulcão e não um pretexto barato pra sua pornografia.

Jaelyca Carolina
Poetisa

domingo, 21 de abril de 2013

As virtudes do Eu Abandonado



A chuva cai sobre meu corpo
E, estendido como um cristo,
As vozes me transpassam,
Anunciam imagens –
As virtudes do Eu Abandonado.

As vozes me atravessam
Na noite ou na manhã
Em que me perco (me encontro)
Na mesma senda ancestral do meu Eu
(Meu próprio algoz).

As vozes me perseguem
– Atravessam a medula da alma –,
Se encravam nas mãos, na pele, na vida...
Se embrenham nos meus poros,
Navegam sobre meus ombros,
Trafegam sobre meus pensamentos.

As vozes me redimem de tudo,
Da vida e dos embaraços –
Quando me vejo só, quando me vejo pó,
Espírito qualquer desvirtuado.

Mário Gerson
Poeta

Na selva

Por onde andam as garças,
No escuro que a noite enlaça?

Solitárias, porém elegantes
Desfilam beleza,
Depois desmaiam!

Por onde andam as garças,
Fujonas das lentes insanas?

Vagarosas, depois ligeiras
Imitam pegadas humanas!

Por onde andam as garças,
Arredias até com o vento?

Afiando os bicos
Treinando as asas
Do esquecimento!

Ana Luíza Dantas de Lira
Poetisa

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Poema perdido

Passou por aqui um poema
Mas ele não foi escrito.
Um poema perdido,
não lido
levado pelo vento gélido da madrugada.

Não foi percebido
Não foi lido
Não será estudado
Não será compreendido.
Não foi escrito
Sozinho na madrugada
deste mundo atroz
e cada vez mais insensível.

Acorda sonhador! Neste mundo não há lugar para as tolices que escreves.

Um poema,
Passou por essa cidade
Mas ninguém prestou atenção.
Todos ignoraram sua passagem.

O poema se perdeu para sempre.

Alexandre Filho
Poeta

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Coração em fogo

Ah... coração abrasado
é um coração que segue tão só.
Ah... os caminhos alastrados
de tanto pó,
pedregulhos e folhas secas,
as árvores só estão os galhos,
a paisagem assim segue acinzentada,
parece que não há vida.
Os homens partiram pra terras verdinhas,
os homens precisam deixar suas casas
por folhas verdes
pra dar comida as crias.
Ah... coração melindroso
guarda a foto no peito
de um amor tão gostoso.
Ah... essas mãos calejadas
vão em aflição
mas os sonhos não morrem
são como o sertão:
de tão acinzentados ficam brancos
mas ficam de pé, meu senhor,
pra florescer.
E é só a chuva chegar
pra florescer
e o menino voltar
pra o amor aquecer.

Eva Timboo
Poetisa

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Café

Mais uma vez, diante da xícara,
Libero um suspiro em x!
Cheirando no ar o que não posso cheirar
com o nariz,
E só posso cheirar com o pensamento.
Lamento!          
Acordada depois do mergulho,
No café obscuro,
Do labirinto do ser.
Rio, porque o que me resta é a risada,
Pois não sou doido, nem bobo
De deixá-lo rir sozinho
De tamanhas trapalhadas.

Ana Luíza Dantas Lira
Poetisa

quarta-feira, 10 de abril de 2013

MOTYRUM

Um movimento
Chegou a este lugar
Grupo de jovens universitários
Simples, verdadeiros operários
Sempre a tudo atentos
Ligados à vários segmentos
Prontos estão a dialogar
Com o propósito de escutar
Tampouco seus olhos desviar
Eles se ajuntam a opinar
O pode, não pode, executar
Afim de levantar a auto estima
De andarmos de cabeça pra cima
Seu nome é bem incomum
Desprovidos de preconceito nenhum
Escutar todos um por um
São contínuos, sem pausa
Que lutam por uma causa
Sem temerem tempo algum
Projeto forte como o Urucum
Por isso, se chamam Motyrum!!


Manoel Wanterly
Poeta

quinta-feira, 4 de abril de 2013

A mais virgem das mulheres

"Prostitutas no Bar" - 1902 - Pablo Picasso.


Meus poemas são como prostitutas,
que se vendem ao papel por um preço baixíssimo!
O simples preço do registro,
                        da lembrança.
Como toda prostituta,carecem de atenção,
mas não ache que vão lhe beijar a boca por isso.
Essa é a regra dos meus poemas: eles nunca irão lhe beijar na boca!
Irão te dar o teu prazer
e fazer sumir os problemas de casa.
Farão o que sua mulher não faz;
Serão seu brinquedo ou seu dominador.
Pela eternidade da próxima hora.
Sua zona é o meu papel.


Kauê Pereira,
Poeta